Na manhã desta quinta-feira (29) a Universidade de São Paulo divulgou a 1ª lista de espera daqueles que se inscreveram para concorrer a uma das vagas na melhor instituição de ensino superior da América Latina, segundo rankings nacionais e internacionais. Na lista, como 3º convocado para matrícula no curso de Direito, aparece um lagartense: o jovem Danniel Prata, de 20 anos, morador do bairro Loiola II.
De origem simples, sua família é formada pela professora efetiva do município Cristiane Prata, sua mãe, além da enfermeira aposentada Célia Prata – vítima de um infarto em julho de 2020, a senhora precisou ser internada no Hospital Universitário de Lagarto (HUL), onde acabou por contrair a covid-19 e veio óbito.
Não é a primeira vez que Danniel é aprovado numa universidade para o curso desejado. Em 2019, ele conquistou uma vaga na Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UNIRIO) e, no ano seguinte, outra vaga, dessa vez, na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ); mas seu sonho sempre foi outro.
A maior parte do ensino fundamental Prata fez na Escola Municipal Luiza Pereira do Nascimento Rodrigues, local em que conseguiu sua primeira conquista acadêmica ao ser medalhista de Bronze na Olimpíada Brasileira de Matemática das Escolas Públicas (OBMEP) e, assim, ganhar uma bolsa de iniciação científica do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). Já o ensino médio, ele cursou integralmente no Instituto Federal de Sergipe (IFS), mas abandonou restando poucos meses para concluir o 3º ano, após encontrar uma vaga de emprego na informalidade e, também, entender que sua área de interesse era as Socias Aplicadas, ao invés das Exatas.
“Na época, a necessidade falou mais alto. Eu já sonhava com uma faculdade de Direito fora do estado, cujos custos, como moradia, minha família não tinha condições de financiar e eu sabia que recurso, embora fosse uma faculdade pública, naquele momento, era mais importante do que o título de técnico em Redes de Computadores”, explica Danniel ao detalhar sua decisão. “Não sei se desistir e recomeçar várias vezes foi a melhor escolha, mas foi o primeiro passo da trajetória que permitiu chegar até aqui”.
Ainda de acordo com ele, estudar sozinho é mais uma vantagem do que uma desvantagem. “Também nunca tive dinheiro para bancar cursinho e sinto que me dou muito bem aprendendo comigo mesmo”. A fórmula parece ter dado certo, uma vez que somente na redação do último Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM) o estudante pontuou 980, a última nota possível antes de 1000 – que é a pontuação máxima.
Para auferir renda, uma vez que mora sozinho desde a morte da avó e após retornar a Lagarto, tendo em vista o fechamento das universidades por conta da pandemia, o jovem se divide entre revisionar textos acadêmicos e livros, além de escrever notícias e publicidades para o portal de notícias O Papa-Jaca. Em virtude do trabalho como redator, Danniel já foi processado por figuras de peso da cidade, a exemplo do ex-prefeito Jerônimo Reis e seu filho, o deputado federal Fábio Reis (MDB) – ambos foram derrotados na Vara Cível, que julgou as ações improcedentes.
“Eu gostaria muito de poder dizer que estou 100% feliz, mas dói não ter como contar essa notícia [da aprovação] a uma das pessoas mais importantes para mim, a minha avó. O que me conforta é saber que deu tempo dela saber que eu herdei sua mesma força de vontade e fibra, o que jamais me permitiria desistir de meus sonhos”, desabafa. “Minha mãe e ela sempre me apoiaram, mesmo não concordando com tudo, e isso também me ajudou muito”.
Com a decisão da reitoria da USP de que as aulas permanecerão remotas até que a cobertura vacinal contra o coronavírus alcance todo grupo de risco, Prata continua em Lagarto, mais precisamente na comunidade em que reside, o Loiola II – um bairro esquecido pelo poder público, porém, repleto de jovens com a esperança e o desejo de uma vida melhor.